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Antropometria e Ergonomia

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Considerações iniciais
    A definição da Ergonomia é indicada como derivação das palavras gregas ERGON (trabalho) e NOMOS (regras), sendo assim considerada como o estudo das leis do trabalho. Nos Estados Unidos a Ergonomia também se utiliza como sinônimo o termo human factor (fatores humanos) (DUL e WEERDMEESTER, 1998). Segundo Abrahão et al. (2009) no Brasil a ergonomia surgiu vinculada às áreas de Engenharia de Produção e Desenho Industrial, e o seu âmbito de atuação foi voltado a aplicação dos conhecimentos produzidos sobre as medidas humanas e a produção de normas e padrões para a população brasileira.
    De forma geral, o surgimento da Ergonomia se constitui de uma abordagem do trabalho humano e suas interações no contexto social e tecnológico, com vistas para a mostra da complexidade da situação de trabalho e da multiplicidade de fatores envolvidos nas práticas profissionais (ABRAHÃO e PINHO, 2002). Assim, as contribuições da Ergonomia enquanto área de interesse para melhorias das condições dentro das organizações abrange não apenas o trabalho executado com máquinas e equipamentos, utilizados para transformar os materiais, mas também em toda a situação que ocorre o relacionamento entre o homem e uma atividade produtiva (IIDA, 2005). Neste sentido, três eixos são listados como critério de avaliação do trabalho com a Ergonomia (ABRAHÃO e PINHO, 2002), sendo eles:
  1. a segurança,
  2. a eficiência, e
  3. o bem-estar dos trabalhadores nas situações de trabalho.
    A Associação Brasileira de Ergonomia – ABERGO criada em 1983 (disponível em: www.abergo.org.br) adota a classificação do entendimento em Ergonomia como o estudo das interações das pessoas com a tecnologia, a organização e o ambiente, objetivando intervenções e projetos que visem melhorar, de forma integrada e não-dissociativa, a segurança, o conforto, o bem-estar e a eficácia das atividades humanas (ABERGO, 2009).
    No âmbito internacional, a Associação Internacional de Ergonomia (International Ergonomics Association disponível em: www.iea.org.br) conceitua a Ergonomia e suas especializações e a definição é de que a Ergonomia é a disciplina científica que estuda as interações entre os seres humanos e outros elementos do sistema, e a profissão que aplica teorias, princípios, dados e métodos, a projetos que visem otimizar o bem-estar humano e o desempenho global dos sistemas (IEA, 2009).
    De maneira geral e a partir das indicações destas associações (ABERGO e IEA) podem ser identificados três domínios de especialização da área de Ergonomia: 1) organizacional, 2) cognitiva e 3) física. Estas especializações abordam as características específicas para cada sistema, assim como ilustra a Figura 1.
Figura 1. Domínios especializados da ergonomia, segundo a Classificação Internacional de Ergonomia. 
Fonte: Adaptado da Associação Internacional de Ergonomia http://www.acaoergonomica.ergonomia.ufrj.br/edicoes/vol2n1/artigos/1.pdf). 
Fonte: Merino e Teixeira (2010).
    Como observado na Figura 1, a antropometria, no contexto da Ergonomia, apoia-se principalmente nas ocorrências da Ergonomia Física apresentando contribuições no que tange tanto os ajustes dos postos de trabalho e equipamentos quanto a projeção de produtos adequados ao homem. Além disso, pode-se dizer que a antropometria contribui significativamente para os estudos na área da saúde (PEREIRA et al., 2009) e quando associada as condições de trabalho suas contribuições estão associadas principalmente para o fornecimento de parâmetros projetuais.
    O termo antropometria tem origem grega e significa ANTHROPO (homem) e METRY (medida) e serve para a determinação objetiva dos aspectos referentes ao desenvolvimento do corpo humano (VELHO, LOUREIRO e PIRES NETO, 1993). Panero e Zelnik (2006) determinam a área como a ciência que estuda de forma concreta as medidas do corpo humano.
    Neste contexto, Sell (2002) indica que a população brasileira por si só já apresenta múltiplas características que englobam misturas de diversas raças e com condições sociais distintas, entre as grandes regiões do país, o que vem a dificultar o projeto dos postos de trabalho no qual todos os trabalhadores devem estar bem acomodados. Ademais, pode-se dizer que estas diferenciações dificultam a produção dos produtos universais.
    Exemplificando estas questões, Iida (2005) demonstra por meio de figuras humanas vistas pela parte posterior as diferenças das proporções corporais de indivíduos de diferentes etnias (americanos, japoneses e brasileiros), assim como ilustra a Figura 2. Por meio da Figura é possível observar que não apenas a massa corporal e a estatura são diferentes, mas também as próprias dimensões corporais diferenciam-se conforme a etnia.

Figura 2. Diferenças entre as proporções corporais de indivíduos de diferentes etnias. Fonte: Iida (2005).
   
 Para Felisberto e Paschoarelli (2001) considerando internamente apenas a população brasileira as condições histórico-geográficas também não favorecem o planejamento projetual no que tange as características antropométricas. Segundo os mesmos autores é ainda muito difícil definir um padrão brasileiro, caracterizando as poucas referências disponibilizadas e encontradas. Além disso, poucos são os dados encontrados que podem ser considerados como representativos de indivíduos específicos o que torna sua utilização pouco confiável ponderando outras circunstâncias. Da mesma forma, pode-se dizer que não são encontrados estudos que vislumbrem a identificação das características antropométricas de todo o corpo humano considerando uma amostra significativa da população brasileira. Os estudos encontrados remetem a indivíduos específicos (MINETTI et al., 2002; PEREIRA e TEIXEIRA, 2006) e englobam poucas variáveis antropométricas, principalmente como massa corporal e estatura (GUIMARÃES e BIASOLI, 2002; MARTÍNEZ-CARRIÓN e PUCHE-GIL, 2009). Estas afirmações são ainda corroboradas por autores como Menin e Paschoarelli (2006) que em seus estudos encontraram discrepâncias com as medidas antropométricas considerando as normas e uma amostra de indivíduos obesos do Brasil. Além disso, o estudo de Guimarães e Biasoli (2002) apresentou diferenças entre a estatura de trabalhadores do Rio Grande do Sul e os dados do Instituto Nacional de Tecnologia (INT) foram de 2,4%, sendo o percentil 50 da estatura do INT equivalente ao percentil 31 do Rio Grande do Sul. Os autores ainda esclarecem que a maior diferença apareceu no percentil 95 e 99 da variável massa corporal onde houve aumento de aproximadamente 11,4% de diferenças o que equivale a 10 kg. Resumidamente, observa-se que estas diferenças se apresentam como importantes pontos de análise e considerações no planejamento de qualquer projeto visto as diferenças encontradas.
    Para o embasamento projetual, as fontes exploradas, muitas vezes são aquelas originadas de normas e padrões internacionais as quais, segundo Felisberto e Paschoarelli (2001) apresentam os mesmos problemas da realidade brasileira. Hanson et al. (2009), por exemplo, indicam que a homegeniedade dos dados antropométricos, na população da Suécia vem diminuindo, o que indica necessidades de atualizações ergonômicas para a adaptação de novos produtos e postos de trabalho.
    Melo (2009) listou os trabalhos de antropometria que tratam do tema de medidas nos diferentes países, assim como segue o Quadro 1.
Quadro 1. Trabalho de antropometria em diferentes países
Fonte: Melo (2009).
    No Brasil, pode-se citar basicamente duas tabelas de medidas antropométricas de trabalhadores. O estudo do Instituto Nacional de Tecnologia (INT) foi realizado com uma amostra de 3100 homens trabalhadores homens de 26 empresas industriais, sendo 65% da região do Rio de Janeiro, 16,6% da região dos estados do Nordeste, 15,7% da região de Minas Gerais e Espírito Santo (as demais regiões não apresentaram expressividades, sendo 0,8% de São Paulo, 0,7% da região Sul do Brasil e 1,2% dos estados do Norte, Centro Oeste e Distrito Federal). Os resultados encontrados no estudo foram associados a 42 variáveis antropométricas e três variáveis biomecânicas associadas à força de tração e compressão, sendo estes resultados ilustrados na Figura 3.

Figura 3. Medidas antropométricas de 3100 homens trabalhadores brasileiros. Fonte: Instituto Nacional de Tecnologia (1988)
   

 O estudo de Couto (1995) foi realizado com 400 trabalhadores também do sexo masculino e 100 trabalhadoras de escritórios de uma fábrica na região paulista do ABC. Estes resultados podem ser observados na Figura 4.

Figura 4. Medidas antropométricas de 400 trabalhadores e 100 trabalhadoras de escritório da região paulista do ABC. Fonte: Iida (2005)
    

Estas medidas se referem às indicações das regiões corporais, indicadas por Iida (2005), ilustradas na Figura 

5.
Figura 5. Principais variáveis a serem utilizadas em medidas de antropometria. Fonte: Iida (2005)
    
No entanto, o que se observa é que o número de indivíduos avaliados não reflete uma amostra significativa da população brasileira. Em muitos casos, são realizados estudos em um ambiente específico, como no caso do estudo de Minetti et al (2002) que avaliou 35 variáveis antropométricas de 85 operadores de motosserra de uma indústria de papel e celulose de São Paulo que se caracteriza por 100% dos trabalhadores da organização.
    Felisberto e Paschoarelli (2001) reuniram os dados disponibilizados por autores como Iida (2005) e Panero e Zelnik (2006) e definiram parâmetros antropométricos por meio de técnicas estatísticas. Desta forma, os autores obtiveram a Figura 6 considerando 29 variáveis antropométricas, assim como indica as referências da Figura 7.

Figura 6. Resultados finais do tratamento estatístico das variáveis antropométricas (valores em cm). Fonte: Felisberto e Paschoarelli (2001)

Figura 7. Representação bidimensional para a identificação das medidas a serem realizadas considerando as 29 variáveis. Fonte: Felisberto e Paschoarelli (2001)
    
Internacionalmente, os artigos científicos encontradas por meio de buscas na literatura (por meio do sciencedirect) podem ser resumidos assim como indica o Quadro 2.

Quadro 2. Informações gerais sobre os artigos internacionais encontrados 

Autor

Ano

Número de indivíduos

Sexo

Idade

País
Mokdad
2002
514
514 homens
22-60 anos
Argélia
Klamklay et al.
2008
300
150 homens
150 mulheres
20,56 ± 71,53 anos
Tailândia
Hanson et al.
2009
367
105 homens
262 mulheres
18-65 anos
Suécia
Chuan, Hartono e Kumar
2010
315
206 homens
109 mulheres
18-45 anos
Singapura
377
245 homens
132 mulheres
Indonésia
   
 De forma geral, observando os dados dos estudos contidos no Quadro 2 pode-se observar que o número de indivíduos avaliados não reflete a população total dos países, fato este já evidenciados por outros autores e que se repete nos estudos brasileiros. Além disso, é necessário o desenvolvimento de acompanhamentos periódicos visto que no estudo de Mokdad (2002) foi evidenciado, com o passar do tempo, crescimento das medidas antropométrica da Argélia. O estudo do autor foi realizado com fazendeiros deste país e englobou 36 medidas que foram comparadas em um estudo longitudinal dos anos 60 da mesma população.
    Além das modificações dos dados como estatura e massa, que foram os mais evidenciados, o autor ainda atesta os efeitos da idade para as mesmas variáveis e ressalta a importância dos levantamentos antropométricos, principalmente no que se refere a projetos de design de ferramental para trabalhadores.
    Especificamente considerando a população tailandesa, caracterizada por 300 universitários, Klamkay et al. (2008) avaliaram 37 medidas de cada indivíduo e traçaram um comparativo entre os dados antropométricos por eles coletados e os disponíveis na Tailândia. Para tanto, os autores comparam duas populações de diferentes localizações do país, a Sul (amostragem de 100 homens e 100 mulheres) a baixo-sul (50 homens e 50 mulheres), demonstrando que mesmo dentre estas populações, existem diferenças nas variáveis antropométricas avaliadas. Confrontando com os dados da população central da Tailândia as diferenças na amostragem masculina, principalmente considerando a massa e a estatura corporal, foram ainda maiores. Diante dos resultados encontrados, os autores concluem que é essencial incorporar estudos antropométricos precisos no processo de desenvolvimento de produtos e dimensionamentos, além de modelos biomecânicos.
    Hanson et al. (2009) abordam de maneira diferente o comparativo, a partir de 43 dados antropométricos coletados de cada indivíduo. Neste estudo, a população sueca, mais especificamente trabalhadores, teve os dados coletados e confrontados com informações datadas de 1969. De maneira geral, os indivíduos avaliados tiveram os valores de largura, profundidade, altura e comprimento aumentados, bem como o peso corporal, o que corrobora com os resultados Mokdad (2002). Ademais, foi encontrado que houve uma diminuição da homogeneidade da população no decorrer do tempo. Mais uma vez, com este confronto histórico, os autores evidenciam a necessidade da atualização de dados antropométricos. Tal necessidade fica ainda mais evidenciada comparando-se os dados de desvio padrão dos estudos de 1969 e 2008, visto que, certas medições variaram até 48,4%.
    As populações da Indonésia e Singapura tiveram seus dados coletados no estudo de Chuan, Hartono e Kumar (2010). Os autores avaliaram 36 medidas antropométricas, traçaram um comparativo entre as populações e atualizam os dados existentes, comparando com aqueles obtidos nos dois países entre si e com os dados disponíveis na literatura. As diferenças encontradas se basearam em outras produções (SIRAJUDDIN et al., 1994; KLAMKAY et al., 2008) indicando novamente o fator geográfico como importante nas diferenças antropométricas, devido a diferenciação genética dos grupos étnicos, o que corrobora com as informações de Iida (2005). Os autores também ressaltaram que as diferenças na qualidade de vida podem influenciar nos dados antropométricos de uma população a longo prazo (ISERI e ARSLAN, 2009). Tal afirmação encontra suporte no estudo da população sueca (HANSON et al., 2009) previamente mencionado e na comparação feita dos dados de Singapura (CHUAN, HARTONO e KUMAR, 2010) coletados e dados de 1990. Além disso, é possível verificar que os indivíduos tendem a apresentar um crescimento, ou seja, há um aumento de estatura, largura e profundidade, bem como massa corporal à medida que as condições de vida melhoram. Segundo Chuan, Hartono e Kumar (2010) tal crescimento pode ainda ser considerado para projetar dimensões antropométricas (massa e estatura) de uma população em um futuro próximo, utilizando regressão linear dos dados, considerando o tempo como uma variável independente. Salienta-se que a prática de utilização de análises estatísticas já foi evidenciada em outros estudos como o de Felisberto e Paschoarelli (2001) e Guimarães e Biasoli (2002).

Considerações finais
    De forma geral, pode-se dizer que ainda são necessários novos estudos associados à antropometria. No Brasil, estas necessidades não são diferentes e demonstram uma lacuna de conhecimento, principalmente em muitas regiões do corpo que não são evidenciadas nos estudos. Mesmo que a estatura e a massa corporal sejam indicadores importantes fica evidenciado que apenas estas medidas não são suficientes para a diversidade de possibilidades de utilização dos dados, como por exemplo, o planejamento de produtos ou de postos de trabalho. Muito dos autores citados neste estudo ressaltam a importância de dados antropométricos válidos e precisos para projetos. Ademais, mesmo com pequenas variações nos dados antropométricos pode haver interferências nas atividades e assim causar prejuízos diretamente na saúde, segurança e produtividade dos indivíduos.
    Além disso, os estudos demonstram que há influências decisivas da geografia nos dados antropométricos. Outras considerações importantes são associadas às diferenças entre sexos (PANEIRO e ZELNIK, 2006; PASCHOARELLI et al., 2007), fatores sociodemográficos, de raça e etnias (SIRAJUDDIN et al., 1994; PANEIRO e ZELNIK, 2006; BOUERI FILHO, 2008; KLAMKAY et al., 2008 e CHUAN, HARTONO e KUMAR (2010).
    Desta forma, evidencia-se que não existe ninguém que possa ser considerado mediano. Pode haver indivíduos que são considerados medianos de peso, estatura ou altura quando sentados. No entanto, indivíduos medianos em duas dimensões de medidas constituem apenas cerca de 7% da população; aqueles considerados medianos em três dimensões corporais são apenas em 3% da população; e aqueles considerados medianos para quatro regiões corporais a porcentagem cai para 2% da população. Neste sentido, Paneiro e Zelnik (2006) ainda salientam que para 10 dimensões corporais não existe um indivíduo mediano.
    Assim, as medidas a serem consideradas para qualquer tipo de estudo ou aplicação deve estar associada às necessidades do projeto considerando seus usuários. Além disso, vale salientar que as medidas devem ser realizadas com instrumentos adequados e pessoas treinadas para tal fim.

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